A Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) aprovou nesta quarta-feira (25) a nova meta para que todos os países membros invistam 5% do Produto Interno Bruto (PIB) em defesa. O acordo, fechado durante a cúpula da aliança em Haia, na Holanda, aumenta a pressão sobre nações que ainda resistem ao aumento dos gastos militares, como é o caso da Espanha.
Desde que reassumiu a presidência dos Estados Unidos, em janeiro, Donald Trump vem cobrando publicamente que todos os aliados da Otan aumentem seus investimentos em defesa. A recusa do governo espanhol, liderado pelo premiê socialista Pedro Sánchez, em aderir à nova meta transformou o país no principal alvo da pressão americana.
Em conversa com repórteres no Air Force One, a caminho da cúpula da Otan em Haia, nesta terça-feira (24), Trump criticou diretamente a postura do governo socialista da Espanha.
“Está havendo um problema com a Espanha. Sempre há um problema com a Espanha. A Espanha não está de acordo (com a meta). O que é muito injusto para o resto”, afirmou.
A preocupação dos Estados Unidos com os espanhóis se baseia em números oficiais da própria Otan. Em 2024, a Espanha, sob comando do governo socialista, foi o país que menos investiu em defesa no bloco, com apenas 1,28% do PIB destinado ao setor – um índice muito abaixo dos 2% combinados na cúpula de 2014 e dos 5% e dos 5% agora estabelecidos para a próxima década. Enquanto Polônia (4,1% do PIB), Estônia (3,43% do PIB) e os próprios Estados Unidos (3,38% do PIB) já investem acima da média proposta em 2014 – e quase próximo da nova meta, a Espanha ficou atrás até mesmo de vizinhos como Portugal (1,55%) e Bélgica (1,30%).
Governo Sánchez tenta flexibilizar compromisso
Apesar de ter assinado a declaração conjunta desta quarta-feira sobre a nova meta, o governo socialista espanhol indicou que, na prática, pretende limitar seu compromisso de investimento em defesa a 2,1% do PIB, cogitando avançar para 3,5% apenas em um cenário futuro previsto no planejamento interno.
Pedro Sánchez alega que elevar os gastos para 5% do PIB colocaria em risco o “Estado de bem-estar social do país”. Segundo o premiê, para atingir a nova meta até 2035 seria necessário um gasto adicional de cerca de 350 bilhões de euros, o que, segundo Sánchez, “só seria possível com aumento de impostos, cortes em benefícios sociais e redução de investimentos em áreas como educação e pensões”.
Corrupção generalizada fragiliza discurso do governo socialista
O argumento de Sánchez para restringir os investimentos em defesa contrasta com a série de escândalos de corrupção que envolvem seus familiares e aliados de governo.
Desde 2024, a esposa do premiê, Begoña Gómez, está sendo investigada sob suspeita de tráfico de influência e corrupção em contratos com universidades e empresas privadas. Investigações apontam que ela teria se beneficiado da posição do marido para obter favorecimento em projetos acadêmicos e captar recursos de entidades privadas.
O irmão de Sánchez, David Sánchez, também responde a um processo por tráfico de influência e prevaricação, após ser contratado para um cargo público na cidade de Badajoz sob suspeita de irregularidades no processo seletivo, que teria sido criado apenas para beneficiá-lo.
O Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), liderado por Sánchez, também está no centro de investigações por corrupção. O principal escândalo é o chamado “Caso Koldo”, que apura fraudes e desvio de dinheiro em contratos públicos para fornecimento de máscaras durante a pandemia de Covid-19. O caso envolve nomes de peso do partido, como o ex-ministro dos Transportes, José Luis Ábalos, e o ex-secretário de organização do PSOE, Santos Cerdán, ambos citados em interceptações telefônicas e alvos de investigações policiais.
Até o procurador-geral da Espanha, Álvaro García Ortiz, é investigado por suposto vazamento de informações para favorecer aliados do PSOE implicados em denúncias de corrupção.
Oposição diz que Sánchez usa caso com Otan como “cortina de fumaça”
Apesar de Sánchez ainda não ser alvo direto das denúncias de corrupção, o envolvimento de familiares e aliados alimenta a percepção de hipocrisia no discurso sobre uso de recursos públicos.
O Partido Popular (PP), de centro-direita, principal força de oposição, acusa o governo socialista de estar instrumentalizando o debate sobre a meta de defesa da Otan como “cortina de fumaça” para desviar o foco dos escândalos de corrupção envolvendo o núcleo do PSOE.
Em sessões no Parlamento, deputados do PP também têm destacado a contradição entre o argumento da falta de verbas para defesa e os milhões supostamente desviados em contratos públicos durante a pandemia. Eles também cobram a renúncia de Sánchez e de ministros próximos.
“Ele (Pedro Sánchez) não deveria voltar (da cúpula da Otan) como presidente do governo espanhol”, disse o líder do PP, Alberto Nuñez Feijóo.
Trump promete retaliar Madri
Após a cúpula da Otan, Trump classificou a postura espanhola como a mais hostil dentro da aliança.
“Acho a Espanha terrível. É o único país que não pagará o valor total. Eles querem ficar em 2%. Acho isso terrível. E, como vocês sabem, eles estão indo muito bem. A economia está indo muito bem. E essa economia pode entrar em colapso total se algo ruim acontecer”, declarou.
O presidente americano afirmou ainda que pretende negociar diretamente um novo acordo comercial com Madri e prometeu penalizar o país pela falta de compromisso militar.
“Vou negociar diretamente com a Espanha. Eu mesmo farei isso. Eles vão pagar. Assim vão pagar mais”, disse. “Vamos negociar um acordo comercial com a Espanha. Vamos fazê-los pagar o dobro. E estou falando sério. Vamos conseguir”, reforçou, mesmo reconhecendo que a Espanha integra acordos coletivos da União Europeia.
Fonte: Gazeta
