O ministro Luiz Fux rejeitou a acusação de organização criminosa armada imputada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e a outros sete réus na ação penal sobre a suposta tentativa de golpe de Estado. Fux divergiu do relator do caso, Alexandre de Moraes, ao apresentar seu voto sobre o mérito das acusações nesta quarta-feira (10), durante sessão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) pela manhã e retomado à tarde.
Anteriormente, ao analisar as questões preliminares levantadas pelas defesas dos réus, Fux havia votado pela anulação do processo por entender que a Corte não é competente para julgar o caso. O ministro continuará fazendo a análise do mérito do caso na tarde desta quarta-feira.
O voto de Fux sobre a acusação de organização criminosa foi fundamentado na falta de elementos específicos exigidos pela legislação penal para configurar o delito de organização criminosa. Segundo Fux, a acusação apresentada pela PGR não demonstrou que os réus teriam se reunido para praticar uma série indeterminada de crimes.
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No total, o procurador-geral, Paulo Gonet, tipificou as ações em: tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado por violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.
“A denúncia não narrou em qualquer trecho que os réus pretendiam praticar delitos reiterados de modo estável e permanente como exige o tipo da organização criminosa, sem um horizonte espaço-temporal definido”, detalhou Fux.
Ele ressaltou ainda que, apesar de eventuais divergências de interpretação jurídica, a análise técnica do caso reforça a necessidade de observância rigorosa dos elementos do tipo penal.
Até o momento, o placar na Primeira Turma é de dois votos pela condenação — Moraes e Flávio Dino — restando ainda a conclusão do voto de Fux e os votos da ministra Cármen Lúcia e do ministro Cristiano Zanin.
Além de Bolsonaro, são julgados o tenente-coronel Mauro Cid, que delatou o suposto plano de golpe; o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin); Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de segurança do Distrito Federal; Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, e Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e candidato a vice de Bolsonaro nas eleições de 2022.
Fux contesta acusação de dano qualificado
O ministro Luiz Fux também contestou a tipificação de dano qualificado e ao patrimônio público tombado, alegando que os réus não poderiam impedir a ação das pessoas que invadiram e vandalizaram as sedes dos Três Poderes nos atos de 8 de janeiro de 2023.
“Não há nenhuma prova de que algum dos réus tinha o dever específico de agir para impedir os danos causados pela multidão em 8 de janeiro de 2023. […] Não há provas nos autos de que os réus tenham ordenado a destruição e depois se omitido”, ressaltou.
Fux vota para anular processo contra Bolsonaro e demais réus
Fux iniciou seu voto analisando as questões preliminares levantadas pelas defesas e, ao considerar que o STF não tem competência para julgar o caso da suposta tentativa de golpe, já que nenhum dos réus tem foro privilegiado, ele votou pela anulação da ação penal.
O ministro alegou ainda que a Primeira Turma não tem competência para julgar um ex-presidente e que houve cerceamento de defesa devido à grande quantidade de provas produzidas pela Polícia Federal com pouco tempo para análise pelos advogados.
Ele considerou que houve um “tsunami de dados”. Foram mais de 70 terabytes de dados – “comparado a muitos milhões e bilhões de páginas” –, que ele disse ter tido acesso, inclusive depoimentos e arquivos inseridos após a aceitação da ação penal.
Fux mantém delação de Cid
O magistrado, porém, votou pela manutenção da validade do acordo de colaboração premiada de Mauro Cid. As defesas dos réus haviam alegado que o delator teria sido alvo de pressão e coação.
Para Fux, “idas e vindas” dos depoimentos poderiam indicar uma “retaliação” ou “criatividade de autoproteção”, no entanto, ao analisar o que foi levantado, decidiu negar as alegações dos advogados dos réus e manteve a validade da delação, deixando para a fase da dosimetria apontar quais benefícios podem ser mantidos e penas eventualmente aplicadas a Cid.
“O réu colaborou com as delações sempre acompanhado de advogado e as advertências pontuais feitas pelo relator ao colaborador. Isso faz parte do rol de perguntas que se pode fazer ao colaborador. E, na verdade, esse colaborador ele acabou se autoincriminando, porque ele confessa”, afirmou o ministro.
Além de Fux, ainda faltam votar os ministros Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, que preside o colegiado, nas sessões marcadas para quinta (11). Já na de sexta (12) se espera ser utilizada para estabelecer a dosimetria das penas.
Nos votos já dados na terça (9), Moraes decidiu pela condenação de Bolsonaro e dos demais réus, classificando o ex-presidente como líder de uma “organização criminosa”. Dino o acompanhou no entendimento, mas defendeu penas mais severas tanto para o ex-presidente quanto para o ex-ministro Walter Braga Netto. Durante a sessão, Dino rechaçou pressões externas.
“Argumentos pessoais, agressões, coações, ameaças de governos estrangeiros não são assuntos que constituem matéria decisória. Quem veste essa capa [toga] tem proteção psicológica suficiente para se manter distante disso”, afirmou.
Fonte: Gazeta