O julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, marcado para começar em 2 de setembro, e a nova ofensiva judicial contra o pastor Silas Malafaia reforçam o clima de mobilização da oposição para o feriado da Independência. A proximidade entre os atos processuais e a agenda política de rua tende a intensificar o tom das manifestações previstas para 7 de Setembro, organizadas como atos nacionais contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e, em especial, o ministro Alexandre de Moraes.
Na quarta-feira (20), Malafaia foi alvo de uma operação da Polícia Federal no Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro. O pastor desembarcava de um voo vindo de Lisboa quando agentes cumpriram mandado de busca e apreensão, recolhendo seus aparelhos eletrônicos e tomando depoimento no próprio terminal. A medida foi determinada por Moraes, que também autorizou restrições cautelares contra o líder religioso.
Poucas horas depois, o ministro ordenou o cancelamento de todos os passaportes de Malafaia, nacionais e estrangeiros, com prazo de 24 horas para entrega à Polícia Federal. Também proibiu que o pastor mantivesse contato com outros investigados, entre eles o deputado Eduardo Bolsonaro, que está nos Estados Unidos.
À Gazeta do Povo, o líder da oposição na Câmara dos Deputados, deputado Luciano Zucco (PL-RS), afirmou que a manifestação do dia 7 de setembro será decisiva “para milhões de brasileiros”.
“As últimas decisões do ministro Alexandre de Moraes, ao desprezar tratados internacionais e impor que bancos ignorem a Lei Magnitsky, somadas às declarações do ministro Flávio Dino e à escalada autoritária do governo na tentativa de censurar as redes sociais, criam um ambiente de enorme instabilidade. Essa postura não atinge apenas a oposição: ameaça o sistema financeiro, o Congresso Nacional e a própria segurança jurídica do país”, disse o parlamentar.
Evangélicos denunciam perseguição a Malafaia e ampliam adesão aos atos de 7 de Setembro
A decisão do STF de incluir o pastor Silas Malafaia no inquérito que investiga suposta tentativa de golpe foi recebida como um ataque direto às igrejas evangélicas. Líderes do segmento afirmam que a medida ultrapassa o campo político e representa uma ameaça à liberdade de expressão e de culto, pilares que mobilizam milhões de brasileiros.
O senador Magno Malta (PL-ES) afirmou à Gazeta do Povo que a ofensiva contra Malafaia reforça a percepção de arbitrariedade do Supremo. “Os evangélicos se sentem diretamente atingidos pela perseguição ao pastor Silas Malafaia. O que está em jogo não é política, é a liberdade de expressão. O STF transformou crítica em crime e passou a rotular como “golpista” qualquer cidadão que ouse questionar os abusos do sistema. Silas não é político, é uma voz que move multidões. No dia 7 de setembro, o povo dará sua resposta nas ruas, em defesa de uma democracia que está sendo corroída”, declarou.
A fala ecoa entre lideranças evangélicas que veem na decisão do Supremo uma tentativa de criminalizar posicionamentos críticos ao governo e ao Judiciário. Nos últimos dias, pastores e parlamentares ligados ao segmento manifestaram solidariedade a Malafaia, reforçando a convocação para os atos de setembro. A expectativa é de que a presença de fiéis e igrejas seja decisiva para ampliar a dimensão das manifestações.
“O pastor Silas Malafaia é uma das maiores lideranças evangélicas do país, com reconhecimento internacional, sendo uma das principais vozes que representam o povo evangélico brasileiro. Não podemos aceitar tamanha perseguição, que ultrapassa o âmbito político e atinge também a esfera religiosa”, disse o Conselho Interdenominacional de Ministros Evangélicos do Brasil (CIMEB) em nota emitida no domingo (17) – antes do cumprimento do mandado de busca e apreensão contra o pastor.
Para o cientista político Adriano Cerqueira, professor do Ibmec em Belo Horizonte, a inclusão de Malafaia no inquérito – com o agravante dos fatos registrados na última quarta-feira – tende a intensificar a mobilização de 7 de Setembro. Ele avalia que a medida fortalece a narrativa da oposição e amplia a adesão ao ato.
“Colocarem Malafaia em uma ação, um inquérito, claro que isso impulsiona o movimento de 7 de Setembro. O Malafaia é um grande aliado do Bolsonaro, está sempre na linha de frente e, até por causa disso, virou um alvo.”
Segundo o especialista, ações do STF contra líderes religiosos repercutem politicamente. “Qualquer ação que saia do Alexandre de Moraes ou do STF contra lideranças evangélicas ressoa no Lula e no PT, fortalecendo a oposição. A vitória da oposição na CPMI, com a indicação do presidente e do relator, mostra que há uma união partidária, inclusive no Senado, que antes não tinha tanta força.”
Atos de 7 de Setembro pelo Brasil
Aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro concentram esforços para um grande ato na Avenida Paulista, em São Paulo, às 15 horas. Liberdade de expressão, liberdade religiosa, anistia estão entre os temas que terão destaque no ato. A oposição também articula manifestações em outras capitais brasileiras neste 7 de setembro, mas a programação ainda está sendo organizada.
Em Belo Horizonte (MG), manifestantes de direita planejam se reunir na Praça da Liberdade, às 10h. As pautas principais na capital mineira são a anistia aos presos do 8 de janeiro e o impeachment de Moraes. O ato é organizado por 11 movimentos conservadores, entre eles Movimento Pró-Brasil, Direita Minas, e Conservadores em Ação.
“No 7 de setembro, o povo vai às ruas gritar o que a toga quer calar: Supremo é o povo!”, afirmou o senador Rogério Marinho, líder da oposição ao Senado, ao comentar nas redes sociais o recente indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro no inquérito que apura a atuação do deputado Eduardo Bolsonaro nos EUA.
Segundo um vídeo postado no perfil do deputado Coronel Meira (PL-PE), a oposição também pretende ocupar as ruas em cidades como Brasília, Belo Horizonte, Recife e Salvador. Mas, até o momento, não constam informações sobre horários e os locais de concentração dessas cidades.
Manifestações fortalecem oposição e aumentam tensão no Congresso
Para o cientista político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), as recentes mobilizações conservadoras têm impacto direto no cenário político e no comportamento do Parlamento. Ele destaca que a manifestação de 3 de agosto foi um divisor de águas para a oposição.
“As manifestações do último dia 3 de agosto surtiram um bom efeito para a oposição, chamaram a atenção nacional e internacionalmente. Foi um grande teste de força, porque aconteceram pela primeira vez sem a presença do ex-presidente, que é o líder desse movimento político.”
Segundo Gomes, a reação no Congresso foi imediata. “Essas manifestações carrearam uma reação da oposição nas duas casas do Congresso, com a obstrução que todos nós acompanhamos, e que deixou os presidentes das duas Casas com a situação de autoridade muito melindrada.”
Ele explica que a tensão aumentou após acordos feitos sem a participação das lideranças do Legislativo. “Eles foram atropelados pelo acordo do Colégio de Líderes, pela disposição do Parlamento em obstaculizar a atuação da Suprema Corte mediante o acordo para pautar a anistia e a PEC para tirar os processos aos quais as autoridades respondem da guarda do Supremo.”
Como será o julgamento de Bolsonaro
O julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, marcado para começar às 9h do dia 2 de setembro, seguirá os preceitos do Regimento Interno do STF e da Lei 8.038/1990, que regula os processos no tribunal.
A sessão de abertura será conduzida pelo ministro Cristiano Zanin, presidente da Primeira Turma do STF, que já definiu o cronograma inicial. Em seguida, o relator, ministro Alexandre de Moraes, fará a leitura do relatório, sistematizando todas as etapas já percorridas: das investigações à conclusão das alegações finais, última fase antes do julgamento de mérito.
Após a leitura, a tribuna será aberta à acusação — com o procurador-geral da República, Paulo Gonet, tendo até uma hora para expor os fundamentos da denúncia. Na sequência, cada uma das defesas dos réus terá o mesmo tempo para suas sustentações orais.
A votação dos ministros seguirá ordem definida: começa por Alexandre de Moraes (relator), depois Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e, por último, Cristiano Zanin — que vota como presidente da Turma. A decisão exige maioria simples, ou seja, três dos cinco votos.
O processo pode ser interrompido por um pedido de vista, instrumento que permite prorrogar a análise. Nesses casos, a Turma deve retomar o julgamento em até 90 dias.
Uma eventual condenação não gera execução imediata da pena: os recursos precisam ser apreciados antes que qualquer prisão seja efetivada. Para os réus militares, a legislação prevê regime diferenciado, com observância à prisão especial.
Como foi a última manifestação contra Moraes
No dia 3 de agosto, milhares de manifestantes foram às ruas em diversas capitais — incluindo São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Goiânia, Belém e Salvador — exigindo o impeachment do ministro Alexandre de Moraes e o fim do governo Lula. Mesmo com o ex-presidente Jair Bolsonaro impedido de comparecer presencialmente, sua ausência não diminuiu o volume dos protestos nem o entusiasmo das manifestações.
Em São Paulo, a Avenida Paulista foi palco de discursos inflamados. O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, celebrou a adesão popular: “Jamais esperei que hoje tivéssemos tanta gente para nos prestigiar”. Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), líder do partido na Câmara, destacou o tamanho da manifestação e fez críticas ao ministro: “Alexandre de Moraes, você vai pagar essa conta aqui na terra e […] na eternidade com Deus.”
O ato, coordenado pelo movimento “Reaja Brasil” e organizado pelo pastor Silas Malafaia, reuniu cartazes que qualificavam ministros do STF e o presidente da Câmara como “Inimigos da Nação” e pediam a anistia aos presos do 8 de janeiro de 2023.
O caráter amplo da mobilização ficou evidente: foram confirmados aproximadamente 30 atos em todo o país. Em várias capitais houve participação midiática de Bolsonaro e aliados — por vídeo, como o deputado Eduardo Bolsonaro em São Paulo e Belo Horizonte —, sinalizando forte articulação política mesmo à distância.
Encerrando o ato, Nikolas Ferreira (PL-MG), ao lado de Silas Malafaia, lançou o lema da próxima mobilização: “Avisa lá que aqui não acabou. A próxima vai ser no Dia da Independência. Um grito à liberdade. Brasil nas ruas e o povo no poder.” A convocação clara para o 7 de Setembro expôs a intenção de manter o momento de pressão nas ruas vivo — e ainda mais robusto.
Fonte: Gazeta