O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), entrou em choque com deputados da oposição para tentar acabar com o movimento de obstrução das votações nesta quarta-feira (6), no segundo dia de protestos no Congresso em reação à prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Ele convocou uma sessão presencial na Câmara, mas foi impedido de iniciá-la por parlamentares acampados no plenário.
Deputados e senadores da direita mantiveram nesta quarta-feira (6) a ocupação dos plenários das duas Casas e cobram um compromisso do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) e do senador Davi Alcolumbre (União-AP) com suas pautas para encerrarem com a obstrução aos trabalhos do Congresso. Entre as principais exigências estão a colocação em votação da anistia para os presos de 8 de janeiro e o impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes.
Alcolumbre decidiu tentar esvaziar a obstrução marcando uma sessão virtual do Senado para quinta-feira (7), mas Motta foi ao plenário da Câmara para tentar abrir uma sessão presencial. Ele chegou ao local por volta das 20h30 e iniciou uma negociação com deputados que ocupavam a Mesa Diretora. Havia a ameaça de suspender os deputados oposicionistas envolvidos no protesto e chamar a Polícia Legislativa para retirá-los do plenário. A presidência da Câmara impediu a imprensa de entrar no plenário para registrar o protesto, mas liberou o acesso às 22h.
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A deputada Júlia Zanatta (PL-SC) levou a filha de 4 meses de idade para o protesto. Segundo o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias, assessores do partido acionaram o Conselho Tutelar para tentar retirar a criança do local. Deputadas da oposição participaram do ato para evitar violência de governistas ou da Polícia Legislativa.
Os senadores Magno Malta (PL-ES), Izalci Lucas (PL-DF) e Damares Alves (Republicanos-DF) se acorrentaram na Mesa Diretora do Senado. Deputados como Hélio Lopes (PL-RJ) apareceram usando esparadrapos simulando mordaça.
A ação de Motta ocorreu após uma tarde conturbada no Congresso. Pressionados pelo grupo oposicionista acampado no Senado e na Câmara, Motta e Alcolumbre realizaram reuniões com os líderes de bancada para tentar fechar um acordo sobre as votações no Legislativo. Apesar disso, líderes da oposição sinalizaram que não compareceriam ao encontro e apenas mandariam um representante para cobrar um encontro particular com os presidentes da Câmara e do Senado.
Mesmo com o impasse, Motta convocou uma sessão presencial. “Essa decisão tem por objetivo garantir o funcionamento da Casa e impedir que a pauta legislativa, que pertence ao povo brasileiro, seja paralisada”, disse o presidente do Senado.
O pacote de medidas apresentado pelos deputados e senadores da direita para acabar com a obstrução dos trabalhos contempla três pautas: a anistia aos presos do 8 de janeiro de 2023, a PEC do fim do foro privilegiado e o impeachment do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). A oposição quer que os presidentes da Câmara e do Senado se comprometam com a inclusão desses temas em votação para encerrar a obstrução iniciada na terça-feira (5). Desde então, sessões de votações que aconteceriam nesta semana precisaram ser canceladas.
“Estamos em obstrução física. Ele [Alcolumbre] fez compromissos com a gente quando veio pedir votos para se eleger presidente do Senado”, disse Carlos Portinho (RJ), líder do PL no Senado, à Gazeta do Povo.
Assim como Alcolumbre, Hugo Motta também se elegeu presidente da Câmara no começo deste ano com apoio da bancada do partido do ex-presidente Bolsonaro. “Estamos em obstrução total na Câmara e no Senado e não vamos recuar enquanto não houver caminhos para a pacificação”, reforçou Sóstenes Cavalcante, líder do PL na Câmara.
Além da bancada do PL, partido de Bolsonaro com 87 deputados e 14 senadores, a obstrução tem ainda o apoio do Novo. Já a cúpula do União Brasil e do Progressistas (PP) orientou que seus parlamentares também não registrem presença para reforçar a obstrução da oposição.
“Continuamos defendendo o diálogo como único caminho possível para encontrarmos soluções que devolvam a normalidade dos trabalhos no Congresso Nacional. O Brasil precisa virar essa página e voltar a focar em pautas que resolvam os problemas econômicos, sociais e de insegurança do nosso País”, diz a nota, assinada pelos presidentes dos dois partidos, Antônio de Rueda, do União Brasil, e Ciro Nogueira, do PP.
O partido de Bolsonaro tenta ainda atrair o apoio dos presidentes do Republicanos, Marcos Pereira, e do PSD, Gilberto Kassab, para o movimento de obstrução. “Vamos organizar as coisas para saber o tamanho que a gente vai formar”, disse Sóstenes sobre a mobilização da oposição.
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Antes da reunião com os líderes desta tarde, Hugo Motta fez uma reunião reservada com membros do partido de Bolsonaro. Além de Sóstenes, estiveram presentes os líderes da oposição, Luciano Zucco (PL-RS), e da minoria, Caroline de Toni (PL-SC).
No encontro, Motta sinalizou aos parlamentares que abriria a sessão da Câmara apesar dos protestos. A posição do presidente da Câmara suscitou reação de Sóstenes que, em vídeo disparado para deputados do PL, orientou imediata ação dos parlamentares para continuar a ocupação do espaço físico do plenário.
O líder do PL determinou que continue também a ocupação do Auditório Nereu Ramos, espaço dedicado a eventos como seminários que, nos bastidores, foi apontado como opção para realização da sessão da Câmara diante da indisponibilidade do plenário.
“Acabamos de descobrir que o deputado Hugo Motta tentou driblar nossa ocupação na mesa para realizar a sessão aqui, no auditório Nereu Ramos. Tentaram nos barrar na entrada, mas nós também ocupamos o Nereu Ramos. Não vão passar por cima. Vão ter que dialogar conosco e ouvir nossas demandas”, declarou Carlos Jordy (PL-RJ).
Já o líder da oposição, Luciano Zucco, confirmou que não houve acordo com Motta, já que o deputado não se comprometeu a colocar as pautas de interesse do grupo em votação. “Cabe ao presidente da Câmara e ao presidente do Senado respeitar a população por intermédio de seus representantes. A anistia tem que ser votada. Se o resultado é aprovação ou não, cabe ao Parlamento brasileiro esta decisão, e não ao judiciário, ou pior, a um juiz que é vítima, que investiga, que julga e que condena”, disse Zucco.
O líder da oposição sinalizou que a ocupação do plenário será mantida até que haja um “diálogo mais franco e propositivo” com o presidente da Câmara. “Desta forma, não tem Dia dos Pais, não tem fim de semana. Iremos permanecer no plenário Ulysses Guimarães, representando o que a gente acredita: justiça e democracia, que já não existe neste país”, completou.
Para se contrapor aos parlamentares da oposição, o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), defendeu que Hugo Motta volte à Câmara para ocupar sua cadeira. “Se o presidente vai para assumir, ele tem autoridade e eles vão se levantar da cadeira. Eles vão se levantar da cadeira, é isso que tem que fazer. Se não fizer, se eles não se levantarem, criarem uma situação de impasse, vai ficar pior ainda na sociedade e no Parlamento”, declarou o petista.
Alcolumbre diz que não vai aceitar chantagem da oposição
Na outra Casa do Legislativo, o impasse com o presidente do Senado se dá em torno do pedido de impeachment de Moraes. Alcolumbre sinalizou que não pretende pautar o pedido da oposição e que não seria “vítima de chantagem” por parte dos apoiadores do ex-presidente Bolsonaro.
A declaração de Alcolumbre aconteceu durante a reunião de líderes convocada por ele também na residência oficial. Antes do encontro, o senador Carlos Portinho afirmou que apenas o líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), iria ao encontro para reforçar a posição do grupo.
Os parlamentares demandam um encontro reservado também com Alcolumbre para discutir seus projetos de interesse. Além de ocupar a meda do Senado, os senadores se mobilizam para reunir 41 assinaturas de apoio ao impeachment de Moraes. Segundo Nikolas Ferreira (PL-MG), já foram recolhidos os apoios de 40 senadores.
De acordo com o regimento do Senado Federal, são necessários 41 votos (maioria absoluta dos 81 senadores) para que um processo de impeachment contra um ministro do STF seja admitido e avance no plenário. Para que Moraes seja efetivamente afastado do cargo, o julgamento exigiria os votos de 54 senadores — o equivalente a dois terços da Casa.
“Nunca estivemos tão perto. No sábado faltavam seis assinaturas e hoje falta apenas uma. O impeachment da Dilma não era realidade até o Eduardo Cunha pautar”, disse Carlos Portinho ao ser questionado sobre a adesão dos senadores ao pedido de impeachment de Moraes.
Diante do impasse com a oposição, Alcolumbre convocou sessão pelo sistema retomo para às 11h desta quinta-feira (7). “A decisão tem por objetivo garantir o funcionamento da Casa e impedir que a pauta legislativa, que pertence ao povo brasileiro, seja paralisada. Não aceitarei intimidações nem tentativas de constrangimento à Presidência do Senado. O Parlamento não será refém de ações que visem desestabilizar seu funcionamento”, disse o presidente do Senado.
Fonte: Gazeta