O governo federal mudou o tom diante do tarifaço de 50% anunciado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, na semana passada. Após bravatas públicas, a equipe do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) recuou e agora recorre à articulação e ao empresariado para tentar evitar danos econômicos.
Na manhã desta terça-feira (15), o vice-presidente Geraldo Alckmin iniciou uma reunião com representantes do setor empresarial afirmando que o governo trabalha para reverter as tarifas de 50% impostas pelos Estados Unidos contra o Brasil.
“O que nós ouvimos aqui foi negociação, ou seja, um empenho para rever, o que coincide com a proposta do governo brasileiro e do presidente Lula. Foi colocado que o prazo é exíguo. O prazo é curto. De que nós deveríamos trabalhar pela sua dilação”, disse Alckmin após o encontro.
No dia seguinte ao anúncio feito por Trump, Lula afirmou, em entrevista à Record, que responderia na mesma moeda. Em tom de enfrentamento, o petista disse que “se ele cobrar 50[%] de nós, vamos cobrar 50[%] deles”.
Antes de recuar, o governo Lula havia sinalizado possíveis retaliações aos EUA na área de propriedade intelectual, o que pode envolver a quebra de patentes, softwares, entre outras ações.
Luís Garcia, sócio do Tax Group e do MLD Advogados Associados, afirma que a estratégia poderia gerar preocupações sobre a segurança jurídica e a previsibilidade do ambiente de negócios no Brasil. “Os investidores geralmente buscam estabilidade e proteção de seus ativos. Se o governo implementar medidas que afetem a propriedade intelectual de forma abrupta ou não transparente, isso pode desencorajar investimentos estrangeiros, aumentando o clima de incerteza e instabilidade jurídica”, disse.
A possibildade de retaliação governo americando publicou novo alerta para o Brasil. O subsecretário de Diplomacia Pública do Departamento de Estado americano, Darren Beattie, usou o X para enviar uma mensagem alertando que a gestão Donald Trump está “acompanhando de perto” a situação no país.
Regras comerciais do Mercosul limitariam tarifa recíproca contra EUA
Segundo Renata Emery, co-head da área tributária de TozziniFreire Advogados, em relação as ameaças de adotar tarifas recíprocas, o governo nem sequer poderia adotar tal medida, em razão das regras comerciais do Mercosul.
“Sendo o Brasil um país membro do Mercosul, o aumento do imposto de importação deve obedecer os ritos para a sua aprovação pelos membros do bloco, inclusive para a adoção de exceções à tarifa comum adotada pelo bloco. Por este motivo, o Brasil não tem a flexibilidade para alterar unilateralmente as alíquotas do imposto de importação”, afirmou.
Além disso, Emery afirma que as alíquotas do Imposto de Importação (II), assim como as de outros tributos, como o Imposto sobre Produtos Industrializados, são adotadas de maneira uniforme por produto, não podendo discriminar qualquer país.
Governo Lula recua e estaria preparando carta para os EUA
Em outro possível recuo, um dia após Alckmin negar que tenha solicitado o adiamento das tarifas ou negociações com os EUA, o governo Lula pode estar preparando uma carta propondo exatamente essas medidas.
Segundo o Estadão, a proposta será enviada a Trump por meio da embaixada brasileira, em carta assinada por Alckmin e pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira. Na carta, vice-presidente e o chanceler irão sugerir a retomada do diálogo e das rodadas técnicas de negociação bilateral, sem uma data específica para que a proposta se concretize.
Caso seja realmente feita, a correspondência será endereçada a Howard Lutnick, chefe do Departamento de Comércio, e ao embaixador Jamieson Greer, Representante Comercial dos EUA (USTr). Os dois participaram de uma videoconferência de negociação realizada em âmbito técnico e político entre os dois governos, em março deste ano.
Indústria pediu prorrogação de 90 dias para início das tarifas
O recuo do governo vem na esteira da pressão da indústria e do agronegócio pedindo por negociações. No fim da tarde de segunda-feira, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) solicitou ao governo brasileiro que intercedesse junto aos Estados Unidos para obter o adiamento mínimo de 90 dias na aplicação das tarifas de 50%.
O pedido foi formalizado durante reunião virtual convocada pelo presidente da CNI, Ricardo Alban, com a participação da secretária de Comércio Exterior do MDIC, Tatiana Lacerda Prazeres, e dos presidentes das federações industriais de todo o país.
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Governo conta com empresários para negociar com os EUA
Após o pedido, Alckmin sinalizou que o governo também conta com a pressão dos setores econômicos nacionais interessados em reverter as tarifas. “Os empresários irão procurar seus pares nos Estados Unidos para trabalharem juntos”, comentou.
Do lado de lá, o empresariado americano também pode auxiliar nas negociações. A Câmara de Comércio dos Estados Unidos (US Chamber) e a Câmara Americana de Comércio do Brasil (Amcham Brasil) divulgaram uma nota conjunta na qual pedem “engajamento de alto nível” dos governos brasileiro e norte-americano para negociarem uma saída às tarifas de 50% sobre exportações brasileiras.
Conforme mostrado pela Gazeta do Povo, desde o dia seguinte ao anúncio das tarifas, a indústria e o agronegócio brasileiros sugerem ao governo que a melhor saída é a negociação. A adoção de medidas retaliatórias seria contraproducente — um tiro pela culatra que prejudicaria o país mais do que as próprias tarifas de Trump.
Fonte: Gazeta