Israelenses do país inteiro saíram às ruas do país inteiro neste domingo (17), para mobilizar uma greve nacional, em atos que prometem os maiores desde que começou a guerra entre Israel e o grupo terrorista Hamas. As pautas dos manifestantes são: a volta dos reféns e a recusa do plano do governo local, liderado por Benjamin Netanyahu, de ocupar a Cidade de Gaza.
Grupos de manifestantes bloquearam algumas das principais rodovias usando pneus em chamas. Até o momento, a polícia deteve de 38 pessoas — 19 foram presos no distrito de Tel Aviv por perturbação da ordem pública, divulgou a polícia em nota, onde explica que alguns dos protestos “degeneraram em distúrbios violentos”.
A greve — domingo é útil em Israel — é convocada por partidos de oposição, grupos sociais, centenas de empresas, e por familiares de reféns, que entendem que o avanço militar em Gaza pode pôr em risco a vida de seus familiares, entretanto, essa visão não é compartilhada por todas as famílias.
As recentes manifestações reuniram entre 70 e 80 mil pessoas, número celebrado pelos organizadores, mas apontado como baixo por críticos — sobretudo, pelo tema dos reféns ser uma pauta unânime dentro da sociedade israelense e considerarem o total baixo comparado aos 10 milhões de habitantes que o país tem.
Somam-se a greve também as principais universidades do país, incluindo a Universidade Hebraica de Jerusalém, o Technion — Instituto de Tecnologia de Israel e a Universidade Aberta, concedendo permissão para que seus funcionários participem dos atos em vez de trabalhar.
Cerca de 75 autoridades também assinaram uma carta apoiando a greve, incluindo o prefeito de Tel Aviv, Ron Huldai, Haim Bibas, presidente da Federação de Autoridades Locais, e Shay Hajaj, presidente do Centro de Conselhos Regionais e chefe do Conselho Regional de Merhavim, na região sul do Negev, segundo apurou o jornal Ynet.
“Apoiaremos todas as ações legais que lembrem os tomadores de decisão de que a devolução dos reféns é um objetivo nacional supremo”. “Estamos comprometidos em apoiar as famílias dos reféns, fortalecê-las e ecoar o som de seus clamores”.
Como por lei, os prefeitos não podem convocar uma greve formal, afirmaram que dedicariam o trabalho público de domingo em nome dos reféns.
O que pensa a sociedade?
A plural sociedade do país da única democracia liberal do Oriente Médio, frequentemente, encontra divergências sobre temas nacionais. A greve geral convocada pelos grupos é um tema de debates e discordâncias agudas.
Quem participa do ato, por vezes, enxerga na mobilização uma maneira de pressionar o governo por um cessar-fogo. Já quem se opõe, afirma que os protestos são politizados e, muitas vezes destacam que a trégua não deve ser um objetivo se não a rendição total do grupo terrorista que controla a Faixa de Gaza.
À Gazeta do Povo, a israelense Noga Roth, de 27 anos, afirma que a sociedade israelense está perdendo a fé na capacidade das lideranças trazerem de volta os sequestrados e que a greve é uma maneira da população que sai às ruas não desistir de lutar pelos reféns.
“E exatamente por isso, fazer algo sempre é melhor do que não fazer nada. Isso te dá a sensação de que você é capaz e que tem um certo poder dentro de si, e vale a pena tentar, porque se você não tenta, não faz nada; e se tenta, não perde nada”.
Para a israelense, “parar o país vale a pena, porque é importante — se houver uma mudança, será uma mudança grande”.
“Se é só uma pessoa, não ajuda em nada, mas se são muitas pessoas, o efeito já é muito maior. E as pessoas não têm muitas formas de fazer sua voz ser ouvida sobre o que pensam”, completou.
Dana Silverman-Siton, cuja irmã Shiri Bibas e dois sobrinhos, Kfir e Ariel, foram sequestrados de sua casa em 7 de outubro e posteriormente assassinados em cativeiro também é uma das lideranças que convocam a greve. “Estou aqui em nome de uma família que não existe mais — meus pais, minha irmã, meus sobrinhos. Eles não têm voz, então eu falo por eles”, disse ela, em atos já iniciados neste sábado (16).
“Nada é normal em um país onde as famílias não sabem se terão seus entes queridos de volta — vivos ou mortos”, afirmou. “Nada é normal em um governo que age como se o tempo não estivesse se esgotando, enquanto soldados e civis morrem em túneis e nossos líderes publicam mensagens sobre falsa unidade.”
“Quando eles foram capturados, o Estado prometeu trazê-los de volta. Quase dois anos depois, o que temos? Slogans vazios, operação após operação e uma sensação de abandono. Essas pessoas não foram esquecidas — elas foram abandonadas.”
Nesta manhã, em uma coletiva de imprensa para dar início à greve, alguns familiares de sequestrados e de pessoas assassinadas nos ataques do Hamas em 7 de outubro de 2023 pediram ao governo israelense um acordo completo, que liberte todos os reféns no enclave e ponha fim à guerra em Gaza.
“Sem estas condições, sabemos que o outro lado não vai aceitar”, disse Naomi Abir, mãe de um jovem com dupla nacionalidade americana e israelense que foi assassinado no festival de música Nova, em declarações divulgadas pela imprensa local.
Grupos mais radicais, como o Omdim beyachad (De pé juntos), iniciaram atos ontem, em Haifa, Jerusalém, Tel Aviv, e outras cidades, onde afirmam denunciar “a fome e o extermínio em Gaza” e “o abandono dos sequestrados”.
E quem é contra a greve?
Crítico dos atos , Daniel Barenbein, de 49 anos, residente de Maale Adumim, o maior assentamento do país, afirma que não irá aos atos de domingo por entender que “é contra tudo que eu penso”.
Segundo ele, “além de gerarem baderna e desobediência civil, os protestos são 100% politizados”. “A última coisa que está se pensando nesses protestos é sobre os reféns”, disse à Gazeta do Povo.
Para Barenbein, o objetivo escuso do protesto é a manifestação contra o primeiro-ministro do país, Benjamin Netanyahu, como em outras ocasiões citadas por ele, a exemplo de quando manifestantes tomaram às ruas do país para repudiarem a reforma judicial proposta pelo premiê antes da guerra, e em outras ocasiões.
“O maior problema da politização das manifestações é tentar pressionar o governo a fazer um acordo a qualquer custo, que não leva nada a não ser manter o Hamas no poder”.
Ele opina que esta, “não é uma manifestação para os países do mundo pressionem o Hamas. É uma manifestação que não tem ponto nenhum”, diz apontando que o grupo terrorista que controle a Faixa de Gaza não quer um acordo. E
“Eu entendo as famílias. Gostaria de deixar bem claro que entendo as famílias… Deus me livre, se eu fosse um pai ou um filho com algum familiar sequestrado em Gaza, eu queria que o governo fizesse tudo para traze-lo de volta, até parar a guerra”, afirma, complementando que nem todos os familiares desejam o final da guerra.
Um dos grupos de familiares de sequestrados que se colocam contrários a paralisação da guerra é o Tikva Fórum (Fórum da Esperança), que reúne familiares de reféns que argumentam que “enquanto o Hamas acreditar que pode sobreviver em Gaza, jamais libertará todos os reféns”.
Eles acreditam que os terroristas não têm objetivo de libertar os reféns e só apoiam uma troca em caso de “um acordo”, que envolva “todos os reféns”, devolvidos “no mesmo ônibus”.
“Dizemos claramente: Um acordo. Todos os reféns. No mesmo ônibus. No mesmo dia. Chega de negociações intermináveis que dão ao Hamas a ilusão de legitimidade ou prolongam o sofrimento de nossas famílias”, diz o grupo.
Política também divida
O cenário político, assim como a sociedade, também está dividido. O líder da oposição, Yair Lapid convocou trabalhadores e estabelecimentos comerciais a permitirem que deixem seus funcionários irem às manifestações. “Você pode simplesmente parar por um dia e dizer que isso é terrível, que isso é triste, que você não está desviando o olhar e não dizendo às pessoas cujas vidas foram destruídas para ‘ficarem quietas’”, disse Lapid.
“Façam greve porque as famílias pediram, e isso é motivo suficiente. Façam greve porque ninguém tem o monopólio da emoção, da responsabilidade compartilhada, dos valores judaicos”. “Façam greve para que, por pelo menos um dia, fique claro que ainda temos algo de bom em comum. Que ser israelense, antes de tudo, significa ter um coração”, completou.
Se por um lado a oposição quer convocar manifestantes, integrantes do governo criticaram as marchas.
O Ministro da Educação, Yoav Kisch, criticou Lapid, afirmando que o líder da oposição deveria “parar de servir o Hamas”.
“O Hamas tomou a decisão de não libertar os reféns e a pressão que vocês estão exercendo prejudica Israel, não nosso inimigo assassino”, disse Kisch. “Se vocês realmente se importam com os reféns, então concentrem suas energias em exercer forte pressão internacional sobre o Hamas e os mediadores”.
O ministro disse que o apelo de Lapid por uma greve é “um presente para o inimigo, não para os reféns”. “Se você realmente se importa com os reféns, então direcione suas energias para uma forte pressão internacional sobre o Hamas e os mediadores”, completou, criticando o líder da oposição.
Neste domingo, o presidente de Israel, Isaac Herzog, esteve presente na conhecida Praça dos Reféns em Tel Aviv, onde estavam parte dos grevistas.
Ele chamou “hipócritas” os “líderes e os meios de comunicação internacionais” e pediu que pressionem o grupo terrorista Hamas para que aceite libertar todos os reféns israelenses na Faixa de Gaza antes de assinar qualquer acordo de cessar-fogo.
“Parem de ser hipócritas. Pressionem, porque quando vocês sabem como pressionar, vocês pressionam. Pressionem e digam ao Hamas: ‘nem acordo, nem nada até que vocês os libertem'”,
Durante sua visita, Herzog se reuniu com alguns dos familiares dos sequestrados pelos terroristas.
“Queremos os reféns de volta. Eles são o mais importante nos assuntos internacionais, e queremos vê-los de volta em casa o mais rápido possível”, assegurou o presidente.
Fonte: Gazeta