O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, discutiu nesta quinta-feira (14) com o ministro Luiz Fux e chegou a dizer que o colega não estava sendo “fiel aos fatos”. Fux reclamou por ter perdido a relatoria de um processo. Para Barroso, a reclamação não foi justa.
Fux era o relator de um recurso sobre a incidência da Cide-Royalties sobre remessas financeiras ao exterior. Por ter sido vencido parcialmente durante o debate da tese, ele perdeu a relatoria para Flávio Dino, que foi o primeiro ministro a abrir divergência. Considerada praxe no Supremo, a troca ocorreu no julgamento desta quarta-feira (13).
No fim da sessão desta quinta (14), Fux apontou que discordou dos colegas em apenas um ponto da tese e declarou sua insatisfação com a medida. “Eu nunca lutei por relatoria. Eu sucumbi aqui por 10 votos a 1 no caso do juiz de garantias, aceitei o dissenso, mas o plenário me concedeu a relatoria. Eu continuei com a relatoria conjunta com o ministro Dias Toffoli”, lembrou Fux.
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“Nunca houve essa heterodoxia de se retirar do relator, vencido em parte mínima, a relatoria”, acrescentou o ministro, destacando que Barroso entregou a relatoria a Dino “de imediato”. Fux disse ter considerado a medida “completamente dissonante”. Em resposta, Barroso afirmou que ofereceu ao colega a possibilidade de reajustar seu voto para permanecer como relator, mas que ele recusou.
“Isso é o que eu queria dizer, Vossa Excelência. Eu não podia nem devia reajustar por uma questão de lisura com os demais colegas que haviam me acompanhado”, rebateu Fux. Os dois então deram início ao bate-boca no plenário.
“Ministro Fux, aqui é assim: se o relator na parte vencida não concordar em reajustar, o primeiro que divergiu tem a relatoria”, afirmou Barroso. Fux rebateu: “Ministro Barroso, eu fui vencido por 10 a 1 no juiz de garantias e mantive a relatoria”.
“Mas Vossa Excelência fez…”, disse o presidente da Corte, que foi cortado pelo colega: “Não fiz reajuste nenhum”. Fux insistiu que Barroso passou a relatoria a Dino sem consultá-lo. Irritado, o presidente do STF subiu o tom e disse que Fux estava errado.
“Pode resgatar a sessão. Eu disse, porque tenho a maior consideração por Vossa Excelência, e Vossa Excelência não está sendo fiel aos fatos. Eu disse: ‘Vossa Excelência não quer reajustar para permanecer como relator?’ E Vossa Excelência disse que não, ‘porque seria uma desconsideração com quem me acompanhou'”, retrucou Barroso.
“Portanto, Vossa Excelência está criando uma situação que não existiu. Desculpe, simplesmente não existiu isso. Nem estou entendendo essa confusão”, disparou o presidente da Corte.
Gilmar tenta acalmar Fux e Barroso, mas sem sucesso
O decano do Supremo, Gilmar Mendes, pediu a palavra para tentar acalmar os ânimos no plenário. Ele disse a Fux que compreendia o “constrangimento” e propôs uma solução colegiada. No entanto, a intervenção de Gilmar não teve efeito nos colegas. Fux interrompeu o decano e começou a dizer que “jamais faria um acórdão que não levasse em consideração…”, mas não conseguiu terminar a frase, pois foi cortado por Barroso.
“Ministro Gilmar, para mim, tanto se me dá quem será o redator do acórdão. Eu perguntei ao ministro Fux, e hoje perguntei ao ministro Flávio Dino, se ele se importava de devolver a relatoria ao ministro Fux, porque, para mim, tanto faz. E o ministro Flávio Dino disse: ‘acho que depois da proclamação não é apropriado’”, pontuou o presidente do STF.
Fux disse que não queria “deixar passar” a situação. Em seguida, Barroso encerrou a sessão do STF. Na quarta (13), o presidente do STF já havia reclamado, mas em tom de brincadeira, da conversa paralela entre Fux e a ministra Cármen Lúcia durante a leitura da fundamentação do julgamento da Cide. “Não estou atrapalhando, não, né?”, disse aos colegas. Logo em seguida, ele riu e continuou a ler.
“Você é uma mistura de mal com atraso e pitadas de psicopatia”
Barroso foi o protagonista de uma das discussões mais lembradas na história do Supremo. Em 2018, Gilmar Mendes pediu a palavra para reclamar da inclusão do habeas corpus do então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na pauta da sessão. Ele fez uma série de críticas ao papel do STF que, na visão dele, estaria sendo manobrado politicamente, em diversos temas controversos.
“Não podemos permitir que se faça esse tipo de manobra. ‘Vou dar uma de esperto e conseguir a decisão do aborto em uma turma com três ministros e daí a gente faz um dois a um’”, afirmou Gilmar. Barroso entendeu a intervenção do colega como uma indireta, pois fazia parte da Turma que poderia analisar o caso.
“Me deixa de fora desse seu mau sentimento. Você é uma pessoa horrível. Uma mistura do mal com o atraso e pitadas de psicopatia. Isso não tem nada a ver com o que está sendo julgado”, disse Barroso, apontando que Gilmar estaria fazendo um “comício cheio de ofensas e grosserias”. A então presidente do STF, Cármen Lúcia, precisou suspender a sessão em meio a protestos de Gilmar.
Fonte: Gazeta